“O surgimento da pessoa jurídica, com o reconhecimento de sua personalidade pela legislação, está diretamente ligado à necessidade de reunir esforços em razão da complexidade da vida em sociedade, possibilitando, assim, a existência de entes autônomos, o sócio e a sociedade. Assim, sendo conferida personalidade própria às sociedades estas passam a poder atuar no campo jurídico, adquirindo direitos e contraindo obrigações. Com o desenvolvimento da economia, entretanto, foi crescendo o número de sociedades personificadas e, consequentemente, a preocupação com a possibilidade do seu uso para fins contrários ao Direito. Assim, o Prof. Rubens Requião, em conferência intitulada Abuso de direito e fraude através da personalidade jurídica, realizada na Universidade Federal do Paraná, já em 1969, abordou o uso abusivo e fraudulento da pessoa jurídica, introduzindo a Teoria da Desconsideração da Personalidade Jurídica no Direito brasileiro. Porém, sem uma previsão legal para sua aplicação, a jurisprudência, então, passou a aplicar dispositivos de lei atinentes a responsabilidade civil, para desconsiderar a personalidade jurídica de empresas. No Direito do Trabalho, os juízes passaram a aplicar o § 2º do art. 2º da Consolidação das Leis do Trabalho como caso de disregard, no entanto, essa norma não se refere à Desconsideração, pois não exige, para sua aplicação, a existência de fraude ou de abuso de direito, requisitos primordiais do instituto em exame. No Direito Tributário também há normas que são consideradas, na doutrina e até mesmo na jurisprudência, como sendo de aplicação da Teoria da Desconsideração, quais sejam, inciso VII do art. 134 e inciso III, do art. 135 do Código Tributário Nacional. Já no Direito Empresarial as regras atribuídas à teoria em estudo são as dos arts. 117, da Lei de Sociedades Anônimas, que dispõe que o acionista controlador responde pelos danos causados por atos praticados com abuso de poder, bem como os arts. 158 e 246, da Lei nº 6.404/76. O Direito do Consumidor inovou, ao trazer no art. 28 do CDC, norma que acolheu o instituto da disregard, porém, listou no referido dispositivo, situações que afastam a verdadeira caracterização da Desconsideração, tais como infração de lei, violação dos estatutos ou contrato social e ato ilícito, insolvência de obrigações, inatividade empresarial. A Lei nº 9.605/98, que dispõe sobre sanções penais e administrativas derivadas de condutas e atividades lesivas ao meio ambiente, por sua vez, insere no seu bojo a Teoria da Desconsideração. O Código Civil/02 passou a preceituar a respeito da aplicação da disregard, no seu art. 50, porém, com inexatidão, pois a norma em questão visa somente ao abuso da personalidade jurídica, sem mencionar, contudo, a utilização da pessoa jurídica de forma fraudulenta. Além disso, apenas estipula quanto à possibilidade de execução dos bens particulares dos sócios, o que também foge à citada teoria, já que desconsideração da personalidade jurídica não significa somente a penhora de bens particulares dos sócios, mas, primordialmente, a declaração de ineficácia do ato fraudulento ou abusivo, para que a sociedade volte ao status quo ante. No Direito de Família também não há qualquer regra que autorize expressamente a aplicação da Disregard Doctrine, cabendo ao julgador observar o caso concreto ao aplicar os princípios realizadores do direito. Agora, com a entrada em vigor do Novo Código de Processo Civil é de se esperar que todas essas duvidas e questionamentos sejam supridos, já que a aplicação da Desconsideração passa a ser expressamente normatizado, com aplicação em todos os ramos do Direito, principalmente no Direito Civil, o qual abarca o Direito de Família e subsidiariamente nos demais ramos.”
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